O ciclo da vida

Deixo-me arrastar por uma maré de ilusões, de pensamentos agradáveis, e esqueço-me que estou a ir ao fundo.

Esta água não sufoca, apenas arranha. Mas é ela também a única música que resta para me embalar, quando a distracção morre e nada mais sobra senão horas mortas… Ou então passam estas a arranhar-me a paciência, mas que alternativa! Desabadas as correntes pesadas sobre o meu ser, apercebo-me no fundo de tudo!

Esta água é um emaranhado de ideias, e as ideias que fluam quentes, como a água quente, elevam-se sempre para a superfície, para evaporar; rodeado de uma nova frescura também eu acabo por voltar ao de cima, para espairecer e recomeçar. Fresco, tudo volto a sentir com leveza, e as distracções rejuvenescem até ao dia onde se eleva sobre mim a próxima carga de ideias mais quentes. É o ciclo da vida, a água.

Deixem-me beber a vossa luz, ideias novas, e aprender a valorizar as coisas agora que sobre a superfície as volto a ver claras! Só quem bate bem no fundo, arrancado de tudo, se vê nu dos medos e dos receios: vê o próprio corpo e tudo o que os medos e os receios o haviam limitado. Deixem-me a atrever ir mais longe na luz desta vez, deixem-me lutar agora, atingir na realidade o que apenas via nas minhas ilusões. E será difícil. Mas já lá estive, lá bem em baixo, e foi mais difícil ainda.

Pois as coisas fazem-se: não fazendo nada, vão-se as oportunidades, deixando reles o doce rasto das ilusões! Fazer, para acaba-las; fazer, pois só assim se concretiza o que desejamos, e o sonho pára de ser ilusão - ou não se concretiza nada, e a ilusão pare também – agora antiquada, agora desgastada de toda a sua doçura. Assim, e que venha a próxima onda. Não lhes será dado espaço para se acumularem em demasia, se algo nisto tudo atrevi-me a aprender, e não terão peso para me afundarem uma vez mais.

Os meus pés dominam sobre o fundo, pois conheço-o. Assim me manterei enquanto me lembrar dele. É o ciclo das coisas.

Um desenho


Imaginação era-me vento que assoprava pela relva fora até à torre que recortava o céu, e todo o meu ser naquele momento se punha para aquele lado, tudo era o centro ali.

Parece que hoje dei-me para as artes (se podemos chamar a isto "arte" xD). Desculpem-me a má qualidade da imagem, não tenho scanner e a minha webcam deixa muito a desejar.

Mais dois poemas minimalistas

I

- Leva-me barco! pois decidi dedicar-me.

Mar a diversão e a sensação.
O ideal e a ambição, a âncora.


II

Pedra morta na minha mente,
Tempo de te arrancar
Por mais que me doa.

Uma pessoa é uma só

Uma pessoa é uma só
Desconhecendo os limites da vida, divaga por tudo o que pensa e cria.
Por vezes perde-se.
Aí quem a trás de volta?

Noutra paisagem

Vive um outro mundo, vive ao nosso lado mas não é real.

Uma paisagem que vem e vai como o mar, divagando como um sonho, perdida dentro de nós. E nós sempre em rumo do seu alcance quando a imaginação nos permite e a preguiça não nos desacelera.

É uma leve nuvem onde nela podemos voar e respirar. Onde formas assumem-se e dissipam-se ao nosso gosto, enquanto o percurso não acaba, no seu rumo infinito até aos horizontes dessa obscuridade e desse mistério que é toda esta paisagem. Morrer é chegar ao seu fim.

E nunca nela vivemos realmente. Quando lá nos supomos refugiados, a realidade em derrocada cai sobre nós, esbate-nos, acorda-nos deste sonho lúcido e recorda-nos em como é dura como pedra, a realidade, e forçada e inescapável! e quando nos apercebemos, da outra paisagem apenas fumaça… réstias de uma experiência que nunca foi realmente vivida, ruído indecifrável…

Mas é quem sempre se determina a voltar, e a cada momento ir pouco a pouco mais longe, e mais ainda; é quem insiste em explorar as suas possibilidades, em explorar todas as diversas formas que possam dar a essa outra paisagem, que aprendem a moldar e dar forma na realidade dura e material quando nela bem se assentam, e daí surgem as obras e os feitos humanos.

Nunca nesta outra paisagem vivemos realmente, mas a sua influência em nós, e consequentemente no real, é notória, portanto lá estivemos.

Luz que escurece

Entre a negrura de sombras que se esbatem contra ou se arrastam pelas correntes da vida, eu, sombra, distinguia-te. No teu brilho angelical bem te via. Entre sombras, eras a única. Via-te a brilhar: vi-o quando olhei para o teu olhar e ele brilhava.

E tu que me retribuías da mesma forma, e em mim reparavas! Pensei que bastasse para me iluminar a alma. Então mantive-me sombra de mim mesmo: deixei que fosses tu, e só tu, a ver-me. Deixei esquecer na escuridão a minha razão e, sem ela, no fim de tudo nada mais cheguei a ver em ti senão as vagas formas angelicais que luz cega e cria.

Afinal quem és, quem foste sempre? Eu nunca te vi realmente… E tu, a mim, alguma vez?