Um conto da minha mente

Era um jardim desnudado de tudo. Abandonado aos ataques do vento, havia-se desvanecido em diversos tons de cinzento. Nele apenas restava eu. E eu esperava, procurando manter viva e ardente a memória do que fora outrora o jardim. “Que paisagem alegre quando faz bom dia! Por ela aqui me ponho a esperar.” Mas o frio trespassava. Por fim me vi a ser levado de volta ao prédio, com o apoio da ventania; contra a mesma, por mim esvoaçou uma rapariga branca como se toda de luz, vindo pousar no banco onde eu estivera. O seu rasto de luz fez-me romper a curiosidade, e isso chegava!, chegava como desculpa para eu voltar atrás. Fui ter com ela, para saber se também ela esperava alguém naquele sítio. A rapariga foi muito direta, “sejamos sinceros, eu não existo”, e dei por mim a olhar para um banco de pedra resistindo sozinho ao frio. Deixei-o, deixei-me levar pelas aragens outra vez, e outra vez a sua voz ressoou, “espera, não fiques assim confuso, não te ponhas de um lado para o outro. Vem ter comigo.” No banco de pedra sentei-me ao lado dela. O frio trespassava, mas ela quanto a isso apenas dizia “que queres, está frio”. Tocou-me na mão: a ideia de eu ter alguém comigo confortava-me. Abracei-lhe para me aquecer, “eu não quero ficar mal com este tempo”, e foi bom sentir o calor da sua pele contra a minha, os seus braços cobrindo-me, e depois o toque das suas mãos na minha cara, descaindo, deixando um rasto de calor. Estava a ser muito pessoal, e eu sentava-me sozinho no banco de pedra. Espirrei, senti o meu peito arranhado. Só se ouvia o vento. Às vezes passava por perto uma ou outra pessoa como aquela que ia ali sozinha. Estava a entrar num prédio. As coisas movem-se à nossa volta mas muitas vezes nem nos damos por elas. Creio que tenha sido a única pessoa que passara por perto, mas a minha preocupação estivera noutro lado, o que eu quisera era um pouco de luz como aquela rapariga que afinal nunca estivera comigo. Tendo entrado a pessoa no prédio, o vazio voltou a predominar por completo nas ruas e no jardim. Era um jardim desnudado de tudo, abandonado ao desinteresse. O vento rugia contra as coisas: a pedra do banco mantinha-se firme e as paredes dos prédios também. Não queria ficar mal com este tempo, não estava ali a fazer nada. Deixei-me seguir o rasto da outra pessoa, com o apoio da ventania, e entrei no prédio também.

O céu humano

Passam os carros, erguem-se os prédios, é esta a minha paisagem, e eu nela não me vejo, estou algures entre a negrura muda da multidão. Tão pequeno me sinto, que me faz querer gritar: ressoar a minha voz contra o que se move e contra as paredes, contra o cimento sem cor e o céu cinzento. Quero elevar o meu ser aos céus! “Olhem para mim, o que sinto é mais forte do que toda esta banalidade das coisas, não deveria de pertencer aqui.” Depois apercebo-me novamente no real. Muito pequenino, atravesso a cidade, desaparecido na multidão, e é assim que as coisas são. Pois ninguém quereria olhar para mim. Por detrás de cada um dos rostos mudos carrega-se uma vida com todo o peso de ter sido vivida. Se desse peso fossem descarregadas algumas lágrimas, não o seria em público certamente: que as nuvens se encarregassem disso por nós. E começa a chover na cidade. Um silêncio de água a escorrer pelas paredes, contra o chão e contra as coisas que se movem, abafando quaisquer ruídos. À chuva se pode chorar à vontade, água com água ninguém diferencia, estaríamos a chorar com o céu inteiro uma coisa que é do tamanho do céu, e no entanto resume-se à pequenez das nossas lágrimas.

Disposta a uma pequena conversa?

Realmente hoje estás muito bonita, sim.

Dir-te-ia isso, se te falasse. “Adoro como estás hoje.”

Poderia dizer tanta coisa. “Desculpa, eu sei que já não nos falamos, e eu sei também que é tudo por minha causa.”

“Gostava que voltássemos a ser amigos como dantes. Que parasses de me evitar, que parasses de te sentir tão pouco à vontade comigo. Gostava…” Se eu for capaz de conversar contigo, não poderei ser mais honesto.

Afinal, é esta a minha maneira de pensar, é esta a minha maneira de ser. Só nunca to mostrei. Falava-te, mas eram raras as vezes em que acabávamos mesmo por conversar. (Eu também não sei como realmente és.)

Gostava de voltar a ir ter contigo e poder dizer, pela primeira vez, “é assim que sou”. Eu enfraquecia tanto quando me aproximava de ti e, com efeito, assim me acabaste por ver. Gostava de uma segunda oportunidade. E eu que já te vejo de maneira tão diferente! “Adoro como estás hoje.”

Um errante no seu rumo

Frente a um lago a forma do meu ser espelha-se vaga e ondeante como num sonho próximo. Deixo a imaginação completá-la enquanto procuro reconhecer-me. Deixo-me divagar pela imaginação.

Sim, bem me lembro desse outro que vejo... Esboçava um sorriso para a vida, aninhava-a entre si, e lá voava leve pelo vento que a vida em turno lhe retribuía. Algo dentro do seu espírito era calor e frescura, e sorria.

Cores do outro lado da água
Tão de fora deste lado do mundo.
Só de pensar que já foram minhas…

E lá bem no fundo ainda há as que me restam mas eu, tão distante delas, mal noto que murcham sem mim. Eu, tão distante delas… e aqui assim pelas que em distância ficaram de mim.

Não, não descanses - ressoa uma voz - descansando dá-te tempo para pensares que não és nada ao sentires-te assim. Uma voz sem palavras, um eco vazio mas devastador na alma, relembrando a alma do quanto está vazia. Uma voz que esbate contra a água e a torna fria, sólida, num gelo que se quebra estilhaçando tudo.

Via uma pessoa firme na sua confiança de que voaria mas não se perderia. Vejo-a a estilhaçar-se.

Tempo de prosseguir, já não há nada para ver aqui.

A entoação do silêncio

Bela jovem pálida,
Os teus lábios mantêm-se cerrados numa cor murcha.

Mas do silêncio da tua palavra desabrochou uma flor. Várias pétalas que se abriram para todos os lados, procurando nesse vácuo respirar algum tom de cor.

Pouco mais são os seus vermelhos e azuis vagos traços enevoados… pouco mais são do que uma mancha no vazio onde se viram nascer atordoados… no teu vestido, onde se espelha a negrura - túmulo em que se cala a pele, e jazes tu como morta, mesmo respirando ainda.
De onde surgiu a flor então? De uma luz proferida: da sua entoação. Palavra colorida, antes de abandonada à ressonância do silêncio e deixada esquecida.
(Rendida a palavra a esse novo silêncio, e prepara-se já a flor para murchar, ainda agora nascida.)

Bela jovem pálida,
Cruzam-se as tuas mãos: um constrangimento de quem já há muito não respira a liberdade do ar livre, da luz fresca, da vida entoada. Na escuridão deixaste-te perder, esqueceste-te. Acorda, para relembrares como realmente és. Acorda os teus lábios e volta a proferir luz.

Impõe a tua voz

Escuridão transparente, tão onde tanta gente te espera que a ninguém surpreende, existes porquê, se só te pões a existir quando te precisam? Não és ninguém realmente. És a tua própria sombra.

Canta-me a tua arte, sombra, e deixa-me ouvir-te. Deixa-me saber quem és nessa tua presença. Deixa-me saber que és presença. Eu? Eu não sou ninguém. Sou uma voz. Mas peço-te. Os outros à tua volta poderão não o fazer. No plano onde tu no teu caminho te cruzas com os outros, e os outros contigo, és sombra e não te apercebem. Não to dirão. Mas peço-te eu. Sou aqui uma voz, és aqui o teu pensamento, e o nosso diálogo é teu, todo teu, só teu, não há espaço para te intimidares. Não sou ninguém, mas falo-te e tu ouves-me, portanto existo.

Fazer

Pássaros cantam, e os seus sons percorrem a minha mente trazendo de volta todos os dias que os ouvi cantar.

Assim nessa distância da memória convivo comigo mesmo, quando me vejo só a andar e sinto os pés doridos, quando o sol arde bem no meio do céu e todo o dia é luz e secura. Assim nessa distância ouvida acompanham-me os vagos ventos da nostalgia, para dar frescura a um dia que passa como os outros, e perde-se entre tantos outros que já passaram.

Pois se me ver a persistir contra o calor e contra a dor, melhor que o faça sentindo que vivo, em cada instante e não em intervalos apenas. Que sou além de corpo que se move, e o meu movimento além do acaso. E no fim chegando a noite, cansado, descanso melhor.

São poucas as vezes que descanso realmente... Vejo demasiadas horas a consumirem-se pelo dia fora, pela noite fora, até que o sono me tome, para acordar uma outra vez, numa outra manhã, passivo uma vez mais, e baralham-se os horários, e consome-se o tempo.

As coisas para além de mim

Para além da janela, enquanto a noite fora descansa, oiço um grilo contra o silêncio estabelecido.

Para além da janela um som invade o meu ser, estabelecendo-se neste vazio escuro, e todo o peso da alma é posto de lado, carga sobre o chão e eu deitado. Mesmo descansando na noite, a vida dispõe-se acordada para aqueles que se dispõem a ouvi-la. Acompanho-a, levo-me, por esse vácuo para além dos céus, e deixando-me levar liberto-me, partilho da sua liberdade e do seu centro, bem no centro do meu ser. Absoluto este ritmo que oiço. Não me deixa a alma dispersar-se em demasia – um som que chama todo o silêncio para um ponto e me diz apenas, as coisas existem e tu estás nelas.

Janelas

Por esta janela vejo o mundo a moldar-se perante mim. Cada palavra que cá ponho e a paisagem expande-se no meu campo de imaginação. E nem sempre é uma paisagem só para mim. Outros nela também têm algo para construir. Não me sinto só ao vê-la, vejo um mundo que não me pertence apenas. Posso apanhar em qualquer lado as palavras que não são minhas.

Mas erguido sempre na parede recorta-se o retrato do real. Recordando-me dele, recordo-me que é realmente uma outra janela, como tantas outras, que ligam o meu mundo com o mundo. É no outro lado onde ando, onde sinto o corpo, e sentindo-o apercebo-me que vivo, e apercebo-me do meu espírito. Só consigo erguer o meu sonho, o meu mundo, na base sólida da realidade; senão desvanece-se sem direcção nem sentido.

Amanhecer

Floresce uma vontade em mim de respirar a vida uma vez mais, agora que me deixei libertar, e sinto o sol, e sinto o ar.

Neste vazio escuro da minha mente, agora limpo e livre, desabrocha uma flor, e dá cor. Vermelhos vivos, amor que esvoaça e ainda me apanha, chama brilhante, branca, um sorriso que me desperta quente como o sol. Todo um despertar cheio de energia para um novo dia!

Pôr-me na palavra

Ponho toda a minha razão de ser na palavra, pois se não o fizer não me dispo tão cedo desta melancolia. Dias há em que uma pessoa está em harmonia com tudo o que a rodeia, onde tudo parece correr no sítio certo, até que algo falhe e tudo desabe. Há dias em que as coisas dão uma reviravolta e se põem contra a ordem a que lhe sujeitamos, e vemo-nos uma vez mais baralhados, a pensar na solução, ou a pensar no que correu mal: que detalhe minucioso falhou onde não demos por tal, mas sentimo-lo.

Esperava eu muito do dia? Contava muito, decerto que sim, que a minha ansiedade se satisfizesse para me manter descansado. E para me manter confiante, para então poder manter o meu optimismo. Sim, quando uma pessoa está satisfeita consigo própria, pressente que algo de bom pode resultar disso, principalmente por acção dela própria. E agora, não me encontro assim... Dou graças à música, por me embalar! Ouvindo-a, só faltava mesmo desabafar, e então me vejo a faze-lo. Ponho toda a minha razão de ser na palavra. Faze-lo mantém-me confiante, devolve-me o optimismo. Simplesmente por faze-lo, simplesmente por concretizar algo que me faça sentir bem e poder dizer que fi-lo por conta própria, porque fui capaz.

Mas na verdade bem preferiria ter uma outra pessoa para me confortar: para ser a minha força. E ver-me sem ela, e sem esperanças disso alguma vez acontecer, põe-me melancólico. Procurei ultrapassar isso com toda a novidade que este dia traria, e realmente trouxe. Mas um momento novo e agradável pouco me serviu, agora, vendo-me sozinho, para arrancar de mim aquela sensação que já me vai entranhada. Nada mais foi senão uma mera distracção – um intervalo – no que se passa em mim. E como já o previa, de nada me resta senão aceitar a realidade, e partilha-la com o tempo para que este ma leve, a aceitação, daqui para fora.

Outra vez o tempo. Sempre o tempo. Estou farto de esperar. Quero continuar a ver o tempo a passar, quero continuar a viver, mas que estejamos em harmonia um com o outro. Talvez é isso. Não o que nos rodeia, mas o tempo. Preciso de estar bem com o tempo, pouco me posso queixar de tudo o resto em meu redor! Tudo… excepto aquela pessoa pela qual o meu tempo se tornou num detrimento. Não lhe tivesse centrado todo o meu ser nela, e o meu tempo não rondaria tanto a sua presença, ou a falta da mesma. Tendo-lhe depositado muita da minha confiança, do meu optimismo, a base da esperança que me escraviza, e vejo assim, coxo, aleijado, o meu espírito.

Que alguém outra me leve. Talvez. Ou me leve eu próprio, quando o tempo voltar ao seu rumo normal e ajudar a levar-me daqui para fora.

Afinal quero o quê, ser levado eu, ou ser levada de mim a ideia que terei de aceitar as coisas como estão? Qual dos dois casos mais me liberta? Não, não: afinal, que quero eu do tempo? Dependo-me demasiado dele.

Para me libertar mais ainda a partir da palavra, escrevo também neste texto um pouco de poesia minha:

Sou vento e posso voar. Já antes voei. Mas o peso dos meus ombros mantém-me rente à terra. Pesado, para voar, só quando me é dada a devida oportunidade para ser leve. Pesam-me os actos, pesa-me a voz, e não voou-o. Pesa-me a timidez, e pouco me vejo em cima. Que o tempo me leve mais vento: se não sou levado, não me deixo ir contra o meu peso. Mas se o sou, não me posso virar para o rumo que desejo…

Tenho uma carga nas minhas costas, e falta-me o exercício com a mesma. Preciso de andar mais, independentemente de quaisquer percalços. Para então poder correr, para então poder voar.


Veremos que resposta poderei vir a dar a isto, um dia mais tarde.

Desistir

Prosseguir, custa. Chegar a algum lado requer esforço, e esforçar é ir em frente, é conhecer território novo, é descobrir que é aprender que é melhorar. Tudo o que custa tende a valer a pena. Independentemente dos erros cometidos. Principalmente pelos erros cometidos.

No caminho em que prossigo existe um indicador. Aponta para dois lados.

Para desistir, vire ao lado e chegue a nenhures. Descanse aí, alternativa fácil para quem não insiste em dar o próximo passo.

Para desistir, chegue ao final do percurso e mude para outro. De nada serve insistir em andar onde já não dá para andar mais. Largue o caminho pelo qual se habituou. Custa, alternativa difícil, mas como tudo o que custa valerá a pena. Só não desista é de andar.

Achando-te, perdi-me

Ainda és a única: digo-o duvidando do meu próprio pensar. Ainda te vejo, sem a fantasia que te envolvia. Já não és princesa, o brilho caiu com a coroa que imaginava em ti, e o que sobrou, foste tu.

Rapariga normal de todos os dias, defeitos e virtudes fazem-te pessoa única, tal como às todas outras; não mais a personagem ideal que me eras outrora. E vejo-te em passos normais, falo-te normalmente, sorrimos e olhamos por ser normal; vulgar situação, mas por detrás do meu olhar há um outro, aquele com que me vias antes e que o escondo agora de ti. Ele ainda lá está, e tu ainda o apanhas quando te apanho eu a olhares-me, escondida de mim; ou apanham-no outros por ti, para ti.

Escureceu a tua luz, mas não se apagou; desapareceu o brilho, mas a chama ainda lá está quando me dedico a reparar nela. E eu quero dedicar-me a reparar nela. Ainda me és a única entre sombras, não pela vaga forma que luz cega, mas por todo o teu ser que o vejo agora mais definido. Ao aperceber-me disto, ao achar-te, perdi-me.

Já não sei o que tu pensas, já nem sei o que hei-de pensar; tudo continua com normalidade, o tempo também. Mas este é duro: passando a correr, passa e muito; tempo até é muito, até se pode fazer muito, não o fazer é excesso de tempo mal aproveitado. Mas ele corre e passa rápido.

Oportunidades do tempo (iii)

Quando uma pessoa, esvoaçando pela vida, se vê pousar sobre a chamada de uns outros olhos, de uma outra pessoa; tímida, esta ou aquela, um obstáculo inevitavelmente forma-se. De inicio apenas uma rajada forte que sopra ao tentarem aproximar-se. Mas passado o tempo transfigura-se em parede transparente, sentida só com a mente mas separando tanto como qualquer outra, anunciando um limite entre os dois, derradeira consequência de terem chegado ao limite do tempo.

É um percurso em que o tempo na sua rodagem mostra os tímidos a sonhar apenas. Pessoas que anseiam por se aproximar de outras: estar com elas, sentir a presença delas, ouvir a voz delas. E chamam-nas com os olhos, contentando-se em esperar, contentando-se em pairar entre sonhos e possibilidades, e não fazem nada.

Um percurso eterno, não por não ter fim, mas por não se deslocarem do seu começo.

Sonham, e deixam-se divagar. Nos sonhos, andam e andam, avançam com a vida, vendo novas caras, novas paisagens, em vontade rejuvenescida; ou recordando velhas amizades, velhos eventos, a vida passada, romantizada. Andam, porque sabem que qualquer momento as poderá levar mais próximas daquelas que anseiam ver. E nos sonhos aproximam-se, sentindo o conforto da presença tão desejada, enchendo-lhes o sentido da vida. Depois acordam.

Um sonho acaba sempre como começa: o seu fim é o regresso da realidade.

"Pois as coisas fazem-se: não fazendo nada, vão-se as oportunidades, deixando reles o doce rasto das ilusões! Fazer, para acaba-las; fazer, pois só assim se concretiza o que desejamos, e o sonho pára de ser ilusão - ou não se concretiza nada, e a ilusão pare também – agora antiquada, agora desgastada de toda a sua doçura. Assim, e que venha a próxima onda de ilusões. Não lhas será dado espaço para se acumularem em demasia, se algo nisto tudo atrevo-me a aprender, e não terão peso para me afundarem uma vez mais" nesta deambulação que é a vida por vezes.

Passadas as oportunidades do tempo,
Só sobra um vago rasto de ideias por completar…
Aí é tarde: acabou.
Poeira que com o tempo acaba por assentar.
Que cada um se contente com o que semeou.

E para quem o vento veio com uma nova oportunidade, não tendo o tempo ainda imposto as suas garras, é só decidir: não fazendo nada, e nada mais será esta oportunidade que uma outra recordação vulgar, destinada a cair num esquecimento mal venha uma outra, tempo depois, sofrimento depois. É só decidir:
- Quero-a, dou-lhe valor, por isso não a deixarei desvanecer-se em pó.

O ciclo da vida

Deixo-me arrastar por uma maré de ilusões, de pensamentos agradáveis, e esqueço-me que estou a ir ao fundo.

Esta água não sufoca, apenas arranha. Mas é ela também a única música que resta para me embalar, quando a distracção morre e nada mais sobra senão horas mortas… Ou então passam estas a arranhar-me a paciência, mas que alternativa! Desabadas as correntes pesadas sobre o meu ser, apercebo-me no fundo de tudo!

Esta água é um emaranhado de ideias, e as ideias que fluam quentes, como a água quente, elevam-se sempre para a superfície, para evaporar; rodeado de uma nova frescura também eu acabo por voltar ao de cima, para espairecer e recomeçar. Fresco, tudo volto a sentir com leveza, e as distracções rejuvenescem até ao dia onde se eleva sobre mim a próxima carga de ideias mais quentes. É o ciclo da vida, a água.

Deixem-me beber a vossa luz, ideias novas, e aprender a valorizar as coisas agora que sobre a superfície as volto a ver claras! Só quem bate bem no fundo, arrancado de tudo, se vê nu dos medos e dos receios: vê o próprio corpo e tudo o que os medos e os receios o haviam limitado. Deixem-me a atrever ir mais longe na luz desta vez, deixem-me lutar agora, atingir na realidade o que apenas via nas minhas ilusões. E será difícil. Mas já lá estive, lá bem em baixo, e foi mais difícil ainda.

Pois as coisas fazem-se: não fazendo nada, vão-se as oportunidades, deixando reles o doce rasto das ilusões! Fazer, para acaba-las; fazer, pois só assim se concretiza o que desejamos, e o sonho pára de ser ilusão - ou não se concretiza nada, e a ilusão pare também – agora antiquada, agora desgastada de toda a sua doçura. Assim, e que venha a próxima onda. Não lhes será dado espaço para se acumularem em demasia, se algo nisto tudo atrevi-me a aprender, e não terão peso para me afundarem uma vez mais.

Os meus pés dominam sobre o fundo, pois conheço-o. Assim me manterei enquanto me lembrar dele. É o ciclo das coisas.

Um desenho


Imaginação era-me vento que assoprava pela relva fora até à torre que recortava o céu, e todo o meu ser naquele momento se punha para aquele lado, tudo era o centro ali.

Parece que hoje dei-me para as artes (se podemos chamar a isto "arte" xD). Desculpem-me a má qualidade da imagem, não tenho scanner e a minha webcam deixa muito a desejar.

Mais dois poemas minimalistas

I

- Leva-me barco! pois decidi dedicar-me.

Mar a diversão e a sensação.
O ideal e a ambição, a âncora.


II

Pedra morta na minha mente,
Tempo de te arrancar
Por mais que me doa.

Uma pessoa é uma só

Uma pessoa é uma só
Desconhecendo os limites da vida, divaga por tudo o que pensa e cria.
Por vezes perde-se.
Aí quem a trás de volta?

Noutra paisagem

Vive um outro mundo, vive ao nosso lado mas não é real.

Uma paisagem que vem e vai como o mar, divagando como um sonho, perdida dentro de nós. E nós sempre em rumo do seu alcance quando a imaginação nos permite e a preguiça não nos desacelera.

É uma leve nuvem onde nela podemos voar e respirar. Onde formas assumem-se e dissipam-se ao nosso gosto, enquanto o percurso não acaba, no seu rumo infinito até aos horizontes dessa obscuridade e desse mistério que é toda esta paisagem. Morrer é chegar ao seu fim.

E nunca nela vivemos realmente. Quando lá nos supomos refugiados, a realidade em derrocada cai sobre nós, esbate-nos, acorda-nos deste sonho lúcido e recorda-nos em como é dura como pedra, a realidade, e forçada e inescapável! e quando nos apercebemos, da outra paisagem apenas fumaça… réstias de uma experiência que nunca foi realmente vivida, ruído indecifrável…

Mas é quem sempre se determina a voltar, e a cada momento ir pouco a pouco mais longe, e mais ainda; é quem insiste em explorar as suas possibilidades, em explorar todas as diversas formas que possam dar a essa outra paisagem, que aprendem a moldar e dar forma na realidade dura e material quando nela bem se assentam, e daí surgem as obras e os feitos humanos.

Nunca nesta outra paisagem vivemos realmente, mas a sua influência em nós, e consequentemente no real, é notória, portanto lá estivemos.

Luz que escurece

Entre a negrura de sombras que se esbatem contra ou se arrastam pelas correntes da vida, eu, sombra, distinguia-te. No teu brilho angelical bem te via. Entre sombras, eras a única. Via-te a brilhar: vi-o quando olhei para o teu olhar e ele brilhava.

E tu que me retribuías da mesma forma, e em mim reparavas! Pensei que bastasse para me iluminar a alma. Então mantive-me sombra de mim mesmo: deixei que fosses tu, e só tu, a ver-me. Deixei esquecer na escuridão a minha razão e, sem ela, no fim de tudo nada mais cheguei a ver em ti senão as vagas formas angelicais que luz cega e cria.

Afinal quem és, quem foste sempre? Eu nunca te vi realmente… E tu, a mim, alguma vez?

Apagar-me por um pequeno momento

Apagam-se as luzes da vida, apago-me da vida, mas não estou como morto. Apenas repouso.

Das janelas estampam-se cores distantes e indistinguíveis, nada perturbando a escuridão. Luzes que decoram o resto de uma paisagem sem luz.

Nada mais há.

No meio do nada, leve e livre pairo, e do exterior nenhum peso me leva ao chão.

As paredes desvanecem e tudo é livre para se expandir até onde o horizonte da escuridão o permitir. Aqui neste quarto encontro-me a flutuar num universo. Aqui neste quarto há tudo, há um infinito de ideias e pensamentos e cores que se propagam infinitamente.

Assim que acabada a escuridão, leve e livre a minha mente acordará para uma nova e outra manhã.

Ares da dúvida

Com receio do peso da verdade, não ma mostraste. Deixaste-me pairar entre possibilidades, abandonaste-me. Então, só, tive que suportar o peso de estar só, na minha viagem para descobrir a verdade ou aceitar que não vou descobrir nada. Só, adaptei-me a estar só, e sofri e aprendi. Agora os meus olhos adaptaram-se a ver a ilusão que te envolve. E tu, iludida, continuas a ceder, por receio de me fazeres sofrer.

Enquanto escrevo

Uma ténue luz dourada revela na escuridão a secretária de madeira encostada à parede. Neste pequeno espaço de luz pairam ideias como borboletas. Ou sobrevoam irritantes como moscas ou perdem-se no escuro, no esquecimento.

Eu vejo-me entretido a apanhá-las e prende-las com palavras.

Na folha do meu caderno, à medida que vou escrevendo, as ideias apanhadas manifestam-se e expandem-se para além da luz, libertando criaturas de todas as diversas formas e cores para o escuro, voando em direcção a uma paisagem mítica de mármores flutuantes sobre densas florestas e cidades nos céus deixando fluir para os verdes em baixo eternos azuis de água, cintilando como estilhaços de vidro quando das nuvens os raios de sol se rompem por momentos.

Esta paisagem pinto-a atrás de mim. Não a consigo ver com os olhos, pinto-a com a imaginação. E construo-a com as ideias que fluam com as palavras, e ouço-a.

A folha branca das nuvens e da imaginação deixa cair esta maré de palavras para as linhas em baixo, desabando numa a uma, como se cascatas sucessivas, e cada vez mais me afundo neste mar. A luz do candeeiro mantém acesa na brancura das folhas o brilho das palavras que faz acender na minha imaginação estas ideias, e fluindo de página em página mantêm-se vivas as ideias, para serem vividas.

Chego ao fim deste desenho de ideias, e abandono o quarto num silêncio de repouso.

No fim, as criaturas de diversas formas e cores continuam a voar pela paisagem e a descobrirem novos recantos e lugares únicos, mesmo quando a luz do candeeiro se desvaneceu e as florestas, as cascatas, e os mármores e as cidades nos ares juntaram-se à escuridão do quarto, num esquecimento.

Brincar

Brincando na minha secretária, eu esboço o que a imaginação me liberta.

Sou um sonhador. Em toda a minha vida sonho, constantemente. Sonho com amigos ou com outras pessoas que me capturaram o interesse. Sonho com o que faço, ou o que poderei fazer. Sonho com ideias que se destacam da realidade, que me pairam na cabeça e valem só por si, pelo meu gosto por elas. Vivo, portanto, uma parte da minha vida a sonhar.

Desde sempre libertei a minha criatividade, no papel, no computador, algures. E fi-lo até deitado no chão, na ausência de um sítio melhor; senão, no conforto da minha cama, na distracção em plena escola, numa mesa seja qual for, da cozinha se necessário, ou da minha secretária.

Brincando hoje na minha secretária, eu penso na minha infância, e penso-a porque me disseram, uma vez mais: “Tenho saudades daqueles tempos”. Penso na minha infância e apercebo-me: “Ainda a vivo. Alterada, de acordo com a alteração da minha pessoa ao longo dos anos. Alterada com as mudanças nos meus pontos de vista, nas minhas perspectivas da vida, ou com base nas experiências mais ou menos boas que me esbati. Mas ainda a vivo, porque ainda me completa, e a minha vida a ela completa.”

Liberto a minha imaginação, porque assim me liberto.

Hoje, bem mais velho, na minha secretária, eu ainda brinco.

Oportunidades do tempo (ii)

Com o tempo as coisas resolvem-se.
Subestimei o tempo, e agora encontro-me incompleto,
Arrancado de uma situação
Que ainda tem muito que se lhe diga.
E o tempo poucas mais oportunidades me dá!

Mas tempo há sempre para reflectir,
E reflectindo, concluo:
Estimei o eu que idealizo,
O eu que deveria de reagir e dizer
De uma determinada maneira,
Numa determinada situação;
E vi-me totalmente incapaz,
Quando me apercebi que,
Pressionado, sou uma outra pessoa.

Tendo-me iludido, assim aproveitei o tempo
A não preparar-me para a realidade.

Um texto sem nome...

    Adianta-se o dia em que pensarei: “Hoje poderia estar melhor.”
      E digo-me: “Quero evitá-lo.”
      “Como?”
    Pergunto então a uma certa outra pessoa: “Como?”
      E tudo mantém-se na mesma.
Às vezes, cabe só a nós.

    A outra pessoa poderá vir a estar melhor, e assim também eu estarei.
      Mostra que o quer. Mas diz que não.
        Como uma criança apanhada a fazer algo às escondidas, para depois nos tentar convencer que não, que não tentou fazer nada fora do normal. E insiste.
    Insistindo, tudo mantém-se na mesma.
Às vezes, não cabe só a nós.

Um poema

Um poema que me apeteceu escrever numa aula, aqui revisto e melhorado:


Permanece enevoado
O caminho em que nos cruzamos,
E perdidos, à deriva continuamos.
Isso entristece-me.
E a tristeza, receio, será
A única coisa que de ti me restará,
Se passado o tempo,
Condenadas forem as oportunidades.

Mas rompe-se pela névoa o sol agora:
Nem sempre dum dia o começo
Aponta o seu rumo e desfecho...

Reflectindo um pouco...

Em resposta ao texto "Love is..." em TRD Fusion, tendo acabado de o comentar, optei também por aqui pôr o que escrevi, com mínimas alterações depois de uma revisão.

O amor é sentir o dia-a-dia de maneira diferente. E depois pensar nisso. Ou deixarmo-nos levar. Ou os dois, mas seja como for, saímos sempre alterados, e é uma questão de observar essas alterações para nos tentar perceber melhor o que na verdade somos (o que ainda escondemos muito de nós próprios).

Será que estamos mesmo a fazer coisas que ("nós homens") não queremos, ou simplesmente a abrir uma parte da nossa pessoa da qual não sabíamos existir? Ou os dois? E então, como identificamos um do outro: qual dos dois casos estamos a libertar e expandir a nossa personalidade, e qual dos dois a fazer um teatro aprisionante da nossa maneira de ser?

Se é para o primeiro caso, não me importo nada de mudar. Ou antes, de evoluir (de crescer?), porque continuarei a ser o mesmo individuo, simplesmente mais consciente de algumas das minhas características, que poderão enriquecer a minha maneira de ser como pessoa (sentir-me-ei mais livre).

Ver-te

Tanto tempo, mas foi preciso naquele dia uma pequena conversa para me aperceber bem da tua voz. Naturalmente, se dou importância a estas coisas, acho-a bonita: e dou-te importância. Não paro de olhar para ti. Vês? Eu sei que já reparaste. Não paro de olhar para ti. Porque estás sempre com aquele sorriso? Pões-me sorridente também. Queixo-me destas coisas, e a culpa é tua! Tanto tempo, e não acredito que estamos na mesma. Não paro de olhar para ti…

Acabei por sonhar contigo. Uma e outra vez, e depois mais ainda. Na realidade, penso em ti. Nos sonhos, estou contigo ou penso em ti. Os sonhos são uma coisa fantástica (uma fantasia): neles temos tempo para estarmos um com o outro, interagirmos, conhecermo-nos; e não parece existir mais ninguém (que nos interrompa). Os sonhos são uma coisa fantástica, mostram-me o que realmente quero. Não ma dão, no entanto, e quando a ilusão desvanece ao toque do despertador (quando o despertador arranca-a de nós, atira ao estado da nossa alma a verdade das coisas), quando acordo e apercebo-me: hoje é dia de escola; e depois penso: hoje vou vê-la; “hoje” torna-se mais fácil de aceitar: de bom agrado acordo para a realidade, e recordo-me, ainda meio no mundo do irreal, ainda quando réstias do meu último sonho permanecem na minha mente, que ela é real, que este sentimento que sinto graças a ela é real. A realidade afectou-me os sonhos e hoje é mais um dia, minha princesa. Amoleço-me nestas coisas, e a culpa é tua! Acabei por sonhar contigo mais vezes.

Apercebendo-me da tua voz - de como ela realmente é - desfigurou a imagem que tinha de ti. É o que dá olhar-te, pensar-te, por tanto tempo, sem que nada quase aconteça. É o que dá não te conhecer bem, e gradualmente, muito lentamente, quase estaticamente, ver esta situação mudar. Naquele dia foi a tua voz que mais me marcou. E mudar, mudou a minha percepção de ti. Reparei um pouco mais na pessoa que escondes por detrás da tua timidez. Oh porque és tu tão tímida? Porque sou eu tímido? (Mas eu gosto de ser tímido. E tu, gostas?) Apercebendo-me da tua voz, pergunto-me o que achas da minha (que não creio que seja alguma coisa de especial, mas será especial a tua, ou é apenas especial a maneira como me toca? O que torna as coisas especiais?) É linda, e tu és linda, ou é apenas tudo o que a tua imagem representa que me fascina? Como se define beleza?

Meu amor (eu amo-te), minha princesa (em todas as definições que encontro para o conceito de bela), minha rapariga dos sonhos (e nos sonhos), meu lírio da inspiração (puseste-me a escrever isto, e não só. E eu tenho estado a gostar), estou a ver-te, não paro de olhar para ti. Vês? A culpa é tua.

Um simples olhar

Tudo começou com um simples olhar.

    Depois seguiram-se outros,
    E agora já a envolvo em raros instantes de conversa.
    O tempo passa, as palavras pouco se trocam,
    E, no entanto, todos estes pequenos momentos bastam
    Para me intensificarem várias sensações,
    Que surgem umas por cima de outras, quase como se atropelando...
    E tão pouco falamos: não entendo.

    Eu que associava olhos giros àqueles outros verdes ou azuis…
    E descubro lindos os dela, sendo apenas castanhos:
    Tão claros, e inusuais
    tal como são as coisas especiais.

    Melhor ainda: o que esses olhos me crêem mostrar!
    Que desejam eles? Que prometem eles?
    Só me resta adivinhar…
    No entanto, falam-me mais ao coração,
    Do que conseguiriam vulgares palavras de paixão.

    Mas se fossem só os olhos deslumbrantes!
    Ela é demais gira
    E sorrindo, deslumbra, mais ainda.
    Então, aí, a minha alma sorri, deslumbrando também!
Tudo começou com um simples olhar.
    Bastou.

As oportunidades do tempo

Uma pessoa anseia por se aproximar de outra pessoa: estar com ela, sentir a sua presença, ouvir a sua voz. No entanto, a pessoa tem um "problema": é tímida. Qual das duas o é, tanto faz, ou até as duas o são.

Sendo tímida, uma pessoa tem tendência para chamar só com os olhos a outra, ou seja: tomar uma posição passiva, contentando-se em esperar, enquanto sonhando com as possibilidades, em vez de activamente procurar a aproximação tão desejada.

Uma pessoa anseia por se aproximar de outra pessoa. A outra pessoa mantém-se distante, quer por timidez, quer por algo mais assustador, como o desinteresse.

Então, passiva, sonha.

Nos sonhos, anda e anda, constantemente a conhecer novas caras, novas paisagens; ou simplesmente a recordar eventos, locais, amizades que se sucederam anteriormente. Anda mais do que a timidez a atreveria a fazer na realidade. Anda, mas cada passo é motivado pela esperança de ver a outra, de a encontrar. E encontra-a, nos sonhos, de relance. Então tenta aproximar-se, sempre na ânsia de sentir o conforto da presença dela. Depois perde-a de vista. E uma vez mais anda e anda, à procura, e toda a sequência repete-se - sempre com a ansiedade despertada de a encontrar, depois o instinto de lhe atrair a atenção, finalmente o atrevimento de tentar avançar, não com passos desta vez, mas avançar sim na relação: estar com ela, pressenti-la, ouvi-la. Lado a lado juntos.

A pessoa tímida acorda. Apercebe-se: mais um sonho que acabou tal como começou. Uma vontade de avançar em frente, que após andar e andar, não se chega a lado algum, mantém-se no mesmo sítio, como uma caminhada sempre esperançosa, e por isso monotonamente eterna. Deprimente. Mas o sonho lá teve que chegar ao fim.

Sonhos baseiam-se na realidade (e às vezes a realidade quase que se assemelha aos sonhos; esta do andar e vê-la, andar e vê-la; chegar ao final do dia, adeus, até ao próximo), e até os sonhos têm um fim: uma hora onde acaba. E aí é tarde: acabou.

Um período de tempo acabou. Semanas esvoaçaram desde que se viram. Tiveram sorte: um outro período, um ultimo período, aproxima-se. Um número semelhante de semanas hão-de esvoaçar. Como acabará?

A caminhada das Decisões

Um anda perdido num bosque. É um bosque muito especial: não é material. Antes, reside na alma e na mente. Perdido num bosque sem direcção, mas com um objectivo claro de alcançar: um objectivo que envolve uma outra pessoa.

Rondam em redor deste bosque inúmeros troncos, inúmeros caminhos entre eles: inúmeras possibilidades de escolha e de acção. Mas por qual deles prosseguir, quando neste universo íntimo e pessoal a única luz que guia é a do pensamento?

Uma luz situada no espaço certo pelo raciocínio, para destacar alguns caminhos e enegrecer outros. Uma luz pintada pela imaginação, para supor as consequências ainda incertas no final de cada percurso - pois os nossos olhos, para tal, por si próprios, tal como nós, são muito pequeninos para o fazer com total clareza.

Numa caminhada onde cada passo se sente, se impõe no nosso estado de espírito, tiranizando-o para o bem ou para o mal, por qual percurso optar? O que menos cansa, o mais rápido? Ou o prolongado e cruel?

Uma luz que torna visível um determinado número de caminhos, mas que não chega a ser suficiente para especificar qual deles o mais certo, o mais definitivo.

Esta luz que nos faz tomar decisões, por si, não é suficiente, apenas porque reside unicamente num único universo: no nosso. Num outro bosque, a outra pessoa também caminha. A luz desse bosque é outra, de um outro universo.

Um novo excerto

Nos últimos meses a minha escrita tem vindo a evoluir um pouco. A minha mentalidade em relação à escrita tem evoluído também. Posso até dizer que nunca me deu tanto gosto escrever como agora. Engraçado, porque cada vez tenho tido menos tempo para o fazer, mas talvez por isso mesmo: quando me encontro com tempo livre, a escrita, juntamente com a leitura (e ambos dão-se par a par lindamente), têm-me oferecido uma satisfação e prazer maiores que anteriormente, simultaneamente servindo como um descanso, que me relaxam do cansaço com que tenho chegado a casa nos dias de semana (tenho simplesmente um horário muito cheio).

Visto com o excerto anterior tem alguns meses, datando deste Novembro (podia jurar que era bem mais antigo!), resolvi pôr algo que criei mais recentemente, nos últimos dias aliás.

É o primeiro capítulo de uma nova história que comecei. Não o está aqui completo. Na verdade ainda não sei como o continuarei, é uma coisa que costumo decidir enquanto vou escrevendo. E críticas serão sempre bem vindas, claro: quero estar consciente de todos os problemas que o texto poderá ter: quero continuar a aprender.

~

Descasando da cidade atrás de si, vira-se do percurso da estrada – deste vestígio urbano – perdendo-a de vista, perdendo-se nos campos, pelo rumo que as frescas aragens da natureza o levam, num divagar solto, como se desnudado das preocupações que o esperam quando voltar – o que por si dá um certo clima de insegurança também: nunca antes pensou em quebrar o ritmo do dia-a-dia normal. Mas aqui está ele, a respirar uma leveza refrescante para uma tarde que pôde muito bem ter sido apenas mais uma.
Casas repousam ao de longe: das chaminés se levanta o fumo ao de leve, livre, devagar desvanecendo no azul vivo do céu que se expande sobre as verdejantes expansões de terreno em todo o redor; e abrindo o espírito os braços para esta redescoberta, este refresco, este respiro: relaxando já com esta ideia: vê, um corpo, caído, no solo, ali à sua frente, ali jazendo perdido sem ninguém mais à vista, de vestido branco por entre os verdes e amarelos, tecido ondeando ao som do vento, ondeando também as ondas do cabelo loiro, quem poderá ser, o que terá acontecido?
- Há algum problema? – Ouve-se, e sem resposta continua a avançar até ela, coração começando a pesar, consciência também, o passo ainda mais, e tentando uma outra vez, suspira:
- Estás bem?
Mas a face dela dorme como se despercebida de tudo. Pelo menos um tom saudável corre na sua pele. Abana-a, sente-a quente: suficiente para abrandar o ritmo inquieto; no entanto insiste, chama-a, levar-lhe-á àquela aldeia se preciso. E uma outra vez insiste.
A rapariga acorda, mostra à realidade os seus olhos ainda meio postos sobre a mesma, meio perdidos, duvidosos; e sentando-se, ronda-os pelo redor. Depois estabelece-os nele. Se tenta dizer algo, acaba por não o fazer, e aí permanece…
- Encontrei-te no chão, fiquei preocupado. Está tudo bem contigo?
Ela esfrega a cara. Apreensivo, ele aguarda-a. E por fim, a rapariga diz:
- Não sei o que me deu. Obrigada.
E assim, ainda amolecida, calma, não diz mais nada.

~

Editado: Alterei a ultima parte do excerto (para melhor, espero eu).

A Reflexão dos erros

~Esta é a segunda vez que me baseio numa mensagem que escrevi num outro blogue. =P
Mas às vezes é assim que arranjamos temas ou ideias para os nossos próximos textos...
~

A Reflexão dos erros

Os nossos erros são um espelho muito especial
Aconchegando-se íntimo dentro de nós,
Revela-nos o que vai lá dentro
Há que aproveitar-nos dele para nos conhecermos
A nós: aos problemas que ganhamos com o intrujo, o indesejado erro

Quando errares, vê-te
A derradeira verdade sobre ti
Observa bem, para saberes em que melhorar
Admite as consequências que vês, aquelas que tu próprio criaste
Enfrenta-as
Desenrasca-te para as superar

Há que manter pé firme
Erguermos-nos se o peso de tais problemas nos desabar
E prosseguir em frente
Por mais que pese o passo

A derradeira verdade que reflecte nesse espelho
Provavelmente é de cores vergonhosas
Mas não lhe afastes o olhar por isso
Não a ignores
Não te iludas
Não te desmoralizes
Abraça-a sim na alma
Como uma bela esperança de mudares

Todos nós cometemos erros. Com eles vivemos. Com eles, podemos aprender e crescer.